Mais um spin-off de Invocação do Mal (2013), A Freira busca trazer um filme de origem de Valak, a entidade que apareceu no segundo capítulo da franquia criada por James Wan. O longa explora um terror mais atmosférico e nesse ponto se destaca pela qualidade da ambientalização.
Sinopse:
Presa em um convento na Romênia, uma freira comete suicídio. Para investigar o caso, o Vaticano envia um padre atormentado e uma noviça prestes a se tornar freira. Arriscando suas vidas, a fé e até suas almas, os dois descobrem um segredo profano e se confrontam com uma força do mal que toma a forma de uma freira demoníaca e transforma o convento num campo de batalha.
A mitologia por trás de Valak já existe, segundo um grimório datado do século XVII chamado Goetia: A Chave Menor de Salomão, tem por autoria, segundo dizem, o próprio Rei Salomão. No grimório 72 demônios são descritos, além de maneiras de invocá-los e torturá-los de modo que eles realizem a vontade de quem os invoca. Valak está entre os 72 demônios, sendo descrito como o 62. A entidade é descrita como o presidente do inferno, com cerca de trinta legiões de demônios sob seu comando. Não é pouca coisa, viu?
Além disso, à figura de Valak é atribuída a serpentes, talvez esse seja uma das coisas que pegaram da mitologia do demônio, sua aparição no grimório é descrita de forma diferente do filme, sendo a freira uma das formas com as quais escolheram trazer a representação da entidade e a isso devemos certa parabenização. A freira causa enorme desconforto e medo, com essa ideia de santidade VS profanação. Sendo, talvez daí, o grande sucesso da sua imagem e história. Nada assusta mais do que uma freira com diabo no corpo, não é mesmo? Nos remetendo a ideia de quem nem mesmo a santidade está livre da maldade.
O mais novo capítulo do Universo Compartilhado de Invocação do Mal, pode ser visto de forma independente, apesar de ter certas ligações com a obra principal, o prequel constrói sua narrativa fechada em si, ou seja, não é necessário ter um conhecimento prévio. Inclusive, nos permite ainda ter vontade de assistir, novamente ou pela primeira vez, os principais filmes da franquia.
O maior destaque d’A Freira é sua ambientalização, temos uma atmosfera escura e enevoada em um castelo na Romênia com estilo gótico, nos remetendo as histórias clássicas, mas ao mesmo tempo mesclando com a contemporaneidade do terror. Há cruzes espalhadas por todo ambiente, o cenário do castelo se revela quase que um personagem do longa, há espelhos nos aterrorizando, revelando o que se mostra oculto diante da realidade. Temos presente um clima religioso, com a falta de tecnologia, uma vez que a trama se passa nos anos 50, é criado um ambiente que faz uso da luz e da sombra para criar todo um clima de terror, de desespero, de desconforto. Em meio a todo esse cenário, se faz o uso do silêncio e da claustrofobia, para no ápice usar a trilha sonora a fim de gerar os famosos jumpscares, que em alguns momentos são previsíveis, mas que não nos impede de pular da cadeira. Um dos pontos fortes é que os sustos vem de uma longa construção do terror e do próprio desespero. Tem cenas, inclusive, realmente assustadoras e bem criadas.
No entanto, temos um problema com o roteiro, que em determinados momentos escolhe saídas fáceis para uma história que poderia ser bem mais original, não aproveitando toda a mitologia incrível e aterrorizadora criada com a figura de Valak. Há a presença muito forte de diálogos expositivos e estes incomodam por simplesmente não soarem nada naturais tampouco acrescentam para a história, pois estamos vendo o que está sendo dito, sendo assim, nossa inteligência e capacidade de observação é não só subestimada, como pouco aproveitada, o que daria uma veracidade mais interessante para a construção da trama. Se perde tempo falando sobre o que estamos vendo, mais do que utilizando esse tempo para nos mostrar e nos sugerir uma ansiedade do acontecimento para gerar terror, como é o caso de Um Lugar Silencioso.
Algo que seria de se esperar do filme é a explicação do porque o demônio assume a figura da freira, no entanto, isso não acontece, em nenhum momento temos o indicativo para tal escolha. O que acaba sendo uma grande perda pra mitologia da história, que poderia ser ainda mais interessante e bem mais construída.
A direção de Corin Hardy não é das mais originais e não tem lá grande destaque, no entanto, o diretor faz bom uso da figura da entidade, utilizando-a em diversos momentos, sendo Valak uma figura constante, mesmo que em diversas situações sua presença esteja à espreita, ao fundo, escondida na penumbra do castelo. Suas aparições, em grande parte, contribuem demais para gerar o medo, além da agonia que somos capazes de sentir através da tela e que nos faz querer se juntar às freiras na reza. A tensão se faz muito presente e a isso se deve a estética lindíssima criada pela direção de arte e fotografia.
Quanto às atuações, a que mais agrada é de Taissa Farmiga – a irmã Irene – sendo capaz de transpor toda a tensão, nervosismo e personalidade de sua personagem. Algo interessante de se saber é que a atriz é irmã da protagonista – Lorraine – em Invocação do Mal. O que nos leva a questionar se a freira Irene tem algum parentesco com a Lorreine, mas a isso teremos que esperar os próximos capítulos para saber.
Enfim, A Freira tem suas falhas, mas também tem seus acertos, o grande problema se encontra em algumas soluções do próprio roteiro de Gary Dauberman (Annabelle 1 e 2), que poderiam levar a um caminho ainda mais original, mais assustador e mais eficiente. No entanto percebemos o potencial que a franquia tem de mexer com elementos que nos causam medo, mexendo com nosso imaginário e sobretudo tendo a capacidade de mostrar sua identidade própria para cada capítulo contado de sua principal história. Cada uma tem um toque único, uma visão própria, elementos de suas épocas, mas ao mesmo tempo apresentam uma ligação, criando um universo realmente compartilhado e extremamente interessante. Portanto, os fãs da saga irão gostar da história, talvez até mesmo com suas falhas, se forem procurar uma história que mistura o clássico com o contemporâneo do terror, que nos traz nostalgia e também uma sensação de frescor, mas, acima de tudo, se procuram um entretenimento capaz de divertir e também de gerar sustos.
O longa estreia hoje, 6 de Setembro, nos cinemas. Preparem-se para rezar muito!
Tagarelem conosco: Irão visitar a abadia e encarar Valak?
Até a próxima tagarelice e lembrem-se de levar terços, cruzes, água benta e o sangue de Cristo para proteger vocês!
Fundadora e Editora-Chefe. Virginiana e defensora da terra.
Um pouco Lorelai demais, não só na quantidade exagerada de café, mas também na capacidade de falar muito em pouco tempo. Whovian apaixonada. É possível me encontrar, entre um salto temporal e outro, em Doomsday ou em qualquer biblioteca ou cinema do mundo.
One Reply to “A Freira | É um terror clássico misturado com o nosso terror moderno”