Tem muitos conteúdos incríveis que a gente perde por puro preconceito, Crazy Ex Girlfriend e Jane The Virgin foram os dois exemplos disso para mim. Mas, hoje quero tratar de Crazy Ex, ainda teremos um papo interessante sobre Jane mais para frente. Já tinha ouvido falar da série criada por Aline Brosh e Rachel Bloom – sendo ela também a personagem principal – algumas vezes, mas o título confesso me afastava, justamente por acreditar que a série se tratava justamente do oposto ao do que ela realmente se trata, ou seja, pensava que seria uma história extremamente machista e misógina e eu não poderia estar mais errada.
A trama utiliza os estereótipos atrelados às mulheres, principalmente o da louca ex namorada para justamente o contestar, a protagonista Rebecca Bunch, inclusive na abertura da série diz ao ouvir o título da série: “Ei, isso é machista!”. Ela é sobretudo uma personagem bem consciente desses arquétipos, no entanto, em diversos momentos a vemos ter atitudes de uma pessoa obsessiva e louca, mas observando mais a fundo entendemos que esse comportamento é suavizado em outras obras da cultura pop, principalmente em comédias românticas, é em Crazy Ex que entendemos esse absurdo. Rebecca não está feliz com o rumo da sua vida, apesar de ser uma pessoa cheia de energia e vida, compreendemos logo de cara que ela não está bem, que tem alguma coisa acontecendo de errado ali. Rebecca busca no amor uma forma de preencher o vazio, ela busca incessantemente aquele conto de fadas contado repetidamente em obras que tanto conhecemos. E tudo isso torna uma proporção ainda maior quando começamos a entender que ela possui problemas psicológicos.
Crazy Ex Girlfriend, apesar de ser uma comédia, ou melhor uma dramédia, e ter um bom humor sempre presente, é uma série que nos apresenta temas bem sérios, temas esses que precisam ser discutidos, como feminismo, rivalidade entre mulheres, maternidade, amizade, amor romântico e não romântico, bissexualidade, masculinidade tóxica, mas o principal ao meu ver é saúde mental. E mais precisamente sobre a importância da terapia na vida de uma pessoa com transtornos psicológicos. Rebecca fugia da terapia como o diabo foge da cruz, abandonou seu tratamento e não admitia certas verdades para si, ela magoou muita gente, com suas atitudes impulsivas e machucou a si mesma no processo, até que ela atingiu o fundo do poço e teve que enfrentar uma grande escalada para tentar se reerguer. Esse é o maior pico da série e o que de mais precioso ela tem a nos passar, precisamos cuidar de nós mesmas e da nossa saúde mental, isso requer uma força inimaginável, não é uma luta fácil, leva um enorme tempo, tem altos e baixos, mas vale a pena. Toda a trajetória de Rebecca Bunch é de autoconhecimento, de evolução, de aprendizado.
Crazy Ex mostra a árdua batalha em se conviver com transtorno, algo muito louvável na série, e olha que tem coisa para louvar, é a representatividade de pessoas com borderline ou transtorno de personagem limítrofe. Tão pouco visto nas obras antigamente e atualmente. O maior aprendizado de Rebecca, ao meu ver, é a de que sua felicidade não se resume aos seus relacionamentos, sejam eles quais forem. Vemos não só em Rebecca, mas em cada uma das personagens femininas da série as pressões de ser uma mulher no mundo moderno, desde as dificuldades de ser uma mulher bem sucedida e independente até as grandes opressões de ser mãe e ter lidar com tudo o que envolve a maternidade, em uma das peças musicais da série, vemos Paula discorrer sobre o quão doido é dar a luz de parto normal, das dores até as emoções que isso envolve. E isso é bem genial, pois mostra a complexidade do ato de ser mãe. A série da CW ainda se destaca por homenagear comédias românticas e musicais ao mesmo tempo em que sabe direcionar críticas ao gênero. Nos mostrando assim, que podemos gostar de algo ao mesmo tempo criticar, algo que sabemos ser difícil encontrar em base de fãs. O olhar crítico é sempre algo necessário!
Rebecca Bunch é uma mulher fora dos padrões, que tem que aprender a gostar do seu corpo, apesar de ser cheia de si, é uma mulher que sabe que passa pelas opressões estéticas e em diversos momentos vemos ela se diminuir perante a esses padrões que ela não faz parte. Rebecca é uma mulher inteligente, que estudou em Yale e Harvard, divertida, engraçada e alto astral, tem uma personalidade única, mas que ainda assim tem problemas psicológicos, nos trazendo uma representação bem realística e nem um pouco estereotipada, como há no imaginário de muitos. Vemos também que todos os relacionamentos de Rebecca contribuíram para a piora dela. Por isso é tão gratificante vê-la se reerguer e ir em busca de se descobrir e de se encontrar.
Enfim, Crazy Ex Girlfriend é uma comédia romântica musical bem original, que desenvolve seus personagem de forma bem real, nos levando a nos identificar e se envolver com os personagens, com as peculiaridades de cada um. Sobretudo a série tem um formato bem diferente, mesclando bem os gêneros, o musical, a comédia romântica e o drama, tudo vem na medida certa. As músicas originais da talentosíssima Rachel Bloom e as peças musicais servem para nos levar a entender o que se passa na cabeça de Rebecca, nos ilustra como ela enxerga o mundo, como se relaciona com ele e como o interpreta. É uma viagem para conhecermos ela de verdade. Se você, como eu, tinha preconceito com o título da série, deixe-me alertá-los, o termo louca ao longo da trama é desconstruído, então permita-se envolver com uma das séries mais original, divertida e inteligente atualmente.
Rachel Bloom – protagonista, co-criadora e compositora das músicas da série – possui um canal no Youtube com seus originais, chamado Rachel does stuff.
Tagarelem comigo: Vão começar a assistir a série, sim ou claro?
Até a próxima tagarelice e lembrem-se de não deixar o seu preconceito impedir de consumir obras maravilhosas!
Fundadora e Editora-Chefe. Virginiana e defensora da terra.
Um pouco Lorelai demais, não só na quantidade exagerada de café, mas também na capacidade de falar muito em pouco tempo. Whovian apaixonada. É possível me encontrar, entre um salto temporal e outro, em Doomsday ou em qualquer biblioteca ou cinema do mundo.